quinta-feira, 26 de novembro de 2009







um dia um amigo me lembrou de uma teoria que devo ter ouvido em alguma aula de geometria.

"Duas retas paralelas se encontram no infinito."

Eu pergunto:

- Como??

Ele responde:

- Porque Deus assim quis.




Um sabor de verdade






Nasci no dia 30 de abril, mas poderia ter sido no dia 10 de maio, como estava previsto. Sou a segunda, filha de pais separados desde meus 5 anos de idade. Isso também importa, assim como tudo que aconteceu na minha história importa.

Hoje eu penso que não houve nenhum evento traumático a que eu não pudesse superar, todos eles foram perfeitamente necessários.

Eu vivo e morro a cada dia. Eu nasci e vivo pra morrer; e voltar sempre, fazer parte sempre. Não acredito que as coisas se acabem, acredito que elas estão sempre num movimento de consubstanciação, a união da criação ao criador.

Não tenho religião, pelo menos nenhuma que seja conhecida pela humanidade ou que tenha um templo ou um nome. Não tem sacerdote na minha igreja, e minha igreja é o próprio mundo.

Eu acredito na transformação.

Fui criada por minha avó Clara, que me ensinou que "na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma". Isso mesmo, a Lei de Lavoisier. Aprendi isso no seu "laboratório" gastronômico, que também era um "ateliê" culinário, porque se tratava de alquimia e arte ao mesmo tempo. E ela era uma alquimista naquela cozinha. Eu me impressionava como ela conseguia produzir deliciosas tortas, bolos, suflês, sopas com a mistura de ingredientes de sabor insosso ou até mesmo desagradável; e ela era também uma artista, porque além de ficar tudo muito gostoso, fazia tudo com muita delicadeza e sensibilidade.

Enfim, o que eu aprendi é que eu posso estender o espaço de experimento para fora da cozinha e que eu não preciso desperdiçar nada, absolutamente tudo se aproveita. Cada sentimento e pensamento, cada idéia, cada opinião (mesmo que mude logo em seguida). Eu possso aproveitar tudo, sem censura, sem vergonha, sem limites.

E assim como as maravilhas da vovó que eu apreciava tanto com o paladar, com o olfato, o tato e a visão, eu estou verificando que é também desse jeito com a vida, com tudo na vida, tudo o que vem. Eu também posso transformar o que num primeiro momento acho ruim pra mim ou que me cause medo em uma experiência maravilhosa.

É uma questão de experienciar, e para isso é preciso se jogar, se entregar. Isso me dá medo sempre, mas aprendi também que mesmo o medo não significa que eu sou covarde, que eu não posso, que não sou capaz ou que é perigoso e mesmo o medo não me impede de ir, de viver, de experimentar. O medo é um sentimento natural que sempre vem sob a iminência do que é desconhecido, daquilo que nunca provei. O medo é a dúvida, é preconceituoso, mas é extremamente necessário, porque é ele que eleva o momento. O medo é como o sal. É um tempero necessário.

O importante é desapegar.

Também venho aprendendo que não preciso me apavorar com o medo e sim aceitá-lo e em seguida soltá-lo, liberá-lo. Também não é uma questão de resistência, nunca é. É imperioso se entregar, ainda que não significa se acomodar. Pelo contrário, a entrega para mim tem sido um exercício e, como todo exercício, no início causa desconforto.

Humildade.

Onde caberia a humildade nisso tudo? Pois é, a humildade é como o fermento. É ela um sentimento que me iguala ao todo. Também me aproxima de tudo, me nivelando ao que é extremamente natural, ao que é verdadeiramente real. A humildade me permite tudo isso que eu já disse, todo esse encontro, de maneira infinitamente plena. E plenitude é sinônimo de abundância. E abundância pra mim não é o que é demais, além da conta, pelo contrário, é o que é satisfatório, é a medida exata para o bem-estar essencial.

E a felicidade que se encerra nesses momentos, é como gota, é como um extrato de Deus, tão singular e genuína e por isso mesmo, a própria verdade.

Por fim, essa verdade, é o néctar mais saboroso. E na cozinha da vovó ela é a baunilha.




não me atraem os homens testosterônicos...

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

A moça do walkman

Ela caminha sem se interessar em chegar.

Seus olhos nada procuram.

Não há aquela normal intenção de observar.

As imagens estão lá, passam por ela como se quisessem chamar sua atenção, mas ela já não estava lá há tempo.

Ela escuta a música que toca em seu walkman, mas não procura identificar o que diz a letra.

Ela está distante daqui.

Pergunto: onde e o que a fez buscar aquele lugar tão seguro?

E enquanto a fotografo em minha memória do outro lado da rua acontece de um pássaro cair sem vida à sua frente. Surpreendo-me ao vê-la mudar seu olhar para o pequeno e frágil animal falecido ao chão. Ela o olha, o percebe e daqui eu sinto que foi como se tivesse se desprendido um pedaço do seu espírito.

Os veículos trafegam como se quisessem chamar sua atenção. Ela que não parece ter a intenção de atravessar, mas que encontra-se de pé em frente à rua, estando ali como em qualquer outro lugar; e como em lugar nenhum.

Eu, de cá, do outro lado, enquanto a assisto me passa uma outra questão: o que será que ela está pensando, ou ainda mais profundamente, qual o sentimento dela agora?

Seu olhar continua fixo naquele animal. Será que ela está a procurar um resto de alma e será que há ainda ali algo que anseie em viver? O que nada tem a ver com a doce e patente esperança, mas tão simplesmente com o processo natural e fatal do curso da vida, como o do rio. Existe ao menos a gota da qual valha a pena tragar?

Ela parece estar presa àquela vida perdida daquele outro ser, como à dela própria.

Seu walkman parece ainda tocar algum som. Qual será a trilha que compõe aquele momento?

Não importa, à ela não importa realmente.

Talvez a música que toca ali seja a única coisa que represente o que está do lado de fora e pode acessar aquele espaço vazio. Seus ouvidos são, então, as portas que dão ao imenso salão de baile sem quem ali dance ao repertório que a moça escolheu.

De repente, ela tira de sua mochila um lenço florido e, misteriosamente, pega o pássaro e o enrola naquele pedaço de pano. Estranhamente guarda-o consigo. Nesse momento todos os carros param e ela enfim atravessa a rua, passa por mim e seu olhar se direciona ao meu e quando isso acontece eu sinto em mim uma profunda compreensão daquela moça do walkman.

Estou em vários lugares que idealizo. Talvez aquela Pasárgada?

Mas estou aqui também e aqui me serve para me levar além. Seja através de uma sensação que me toma de repente, seja pela música que ouço e me remete a um país que desconheço.

Eu me carrego para viagens agradáveis do meu sonho.

Eu observo o que está a minha volta e ainda não sei dizer se participo.

Sinto-me contente por perceber que encontrei a caligrafia para descrever isso. Eu que não sabia nem ao menos essa importância.

É isso! São todas as coisas que me controem, bem como tudo aquilo que passa a me interessar, mas é bom também saber que estou aberta aos novos encontros, que são tantos. Persevero nessa busca interminável de infinitas possíveis descobertas.

É tão magnífico! Porque sempre há algo acontecendo enquanto eu aconteço também dentro de mim.

Um certo compasso

Giro em torno de mim

Um compasso estreito de mim

E escuto em mim um som

Uníssono em lá

Sequenciado, ininterrupto lá

E lá, distante até de mim

Pode-se ouvir

O som que de mim propaga

E mesmo se em dó me chega a dor

Pra lá se vai meu tom que sai

E o lugar é certo

Nem bemol, nem sustenido, nem só um pouco perto

É o reduzido lá

Buscando o acorde

Pra me acompanhar

Brincante menina

Se fantasia no escuro

A roupa que a veste

A disfarça no deserto sem rostos

Distrai sua confusão no salto

E pula e se maquia

E se despe daquelas peles passadas

Sonâmbula, não vê a hora que passa

Brinca no tempo, que é todo dela

E dança e se revela

No embalo de cadência infantil

Ela é toda sua

Ela é toda minha

Ela sou eu

Ela você

E se despe de peles passadas

Não vê a sonâmbula que passa com a hora

Se dança e me revela

Infantil

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Aqui onde eu moro os galos não cantam anunciando a alvorada
Escuto o som dos pássaros, dos pardais, bem-te-vis, as aves urbanas.
esse som que invade o dia logo cedo,
junto com o ronco dos motores.
é o mundo acordando...
tô me sentindo meio descompassada.

Não estou ganhando nada com isso
Não estou meditando, escrevendo um livro ou compondo uma música
Não estou fazendo planos para o futuro.
Não, nada disso.
Só não estou optando por não dormir.
Fico presa à coisas absolutamente sem importância.
E as horas vão passando, passando...


Deus ajuda quem cedo madruga.
Mas será que Ele alivia as dores
dos que vigiam o tempo durante a madrugada?

Lugares onde eu passeio